26 de setembro de 2017

Rio de Janeiro e a Gunabara



A desgraça do Rio de Janeiro vem de longe. Muito longe. Seus mais de 100 policiais mortos em combate nesse ano de 2017 é um retrato, trágico e incompreensível, de uma das faces da realidade cruel da outrora Cidade Maravilhosa. Vivemos hoje numa cidade e num Estado que quase nada funciona direito. A Polícia é a instância mais recorrida pelos moradores. Aqui se chama a polícia para tudo. Um soldado da PM é sobretudo um especialista em gente. O carioca se socorre dela para fazer parto, separar briga de vizinhos, coibir abusos de comportamento, de falta de educação, para retirar casa de abelhas, de maribondos e até socorro a velhos, inválidos e animais. Trocar tiros com bandidos é apenas uma de suas missões diárias. Quer saber mais? Busque uma pesquisa de um dia no número 190 o telefone de socorro policial posto a serviço da população.

Essa dura realidade é a foz de um caudaloso Rio de problemas. Foi uma cidade maravilhosa até os anos setenta do século passado. A desgraça começa no governo Juscelino Kubistchek. Ele construiu Brasília e levou a sede do governo federal. O Rio de Janeiro era uma cidade Estado. Como Singapura. Fácil de governar, compreendia apenas o Estado da Guanabara. Cercada de praias e montanhas foi o cenário perfeito para políticos, poetas, intelectuais, artistas, pintores, escritores, vagabundos e putas. Toda essa malta constituía a mais fina flor da cultura nacional. A Guanabara era o centro irradiador de uma fulgurante constelação de inteligência e assim permaneceu após a saída do governo federal. O Governo se foi sem um planejamento de longo prazo para a cidade. Não houve prazos para tirar o estamento burocrático federal do Rio de Janeiro. Aqui ele permaneceu e ainda hoje se encontra fragmentos dessa casta. Mas o orçamento gordo da Republica foi embora.

Ainda daria sorte o Estado da Guanabara. Em sua primeira eleição venceu a figura excêntrica do jornalista Carlos Lacerda. De repórter, comentarista e jornalista político acabou se transformando no maior administrador urbano que o país já viu. Em poucos anos rasgou a cidade com obras monumentais que não só trouxe conforto e progresso para a população como beleza, estética e elegância para um cenário deslumbrante. Removeu favelas inteiras e criou parques fascinantes. Dotou a cidade de um sistema de abastecimento de água que ainda hoje socorre sua população. A cidade se bastava. Jorrava alegria e cultura. Lacerda saiu do governo endeusado. Sonhava ser candidato a Presidente da Republica. Deixou no cargo o seu vice o brilhante advogado Raphael de Almeida Magalhães, esse outro vulcão em inteligência e amor à cidade. Coube a ele arrematar o que Lacerda empreendeu. Foi Lacerda quem trouxe um grego chamado Doxiades, o mais respeitado arquiteto urbano da época. Este senhor redesenhou a Cidade e criando as linhas com nomes de cores que dão ao Rio de hoje maior espaço de movimentação urbana. Até os sucessivos governos não terminaram o plano.

Aí veio 1964 Lacerda foi cassado, Juscelino também e a Guanabara passou a ser governada pelo diplomata Negrão de Lima. Vai entender essa gente... Negrão foi eleito contra o candidato de Carlos Lacerda, o professor Flecha Ribeiro. Aquele que tudo fez para tornar o Rio moderno não conseguiu fazer o seu sucessor. Negrão de Lima fez um governo elegante e burocrático tal qual sua figura. Mas era apoiado pela esquerda. Daí fortaleceu o mito e a corrente de pensamento ideológico que iria dominar o pensamento e a cultura da cidade após 1964. Depois disso vem os militares com a Revolução. Até o final do governo Médici a Guanabara brilhava no cenário nacional. Não por questões ideológicas, mas os militares através do Presidente Ernesto Geisel é quem vai plantar a semente e pavimentar o caminho para o caos. Isso fica para depois.

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